Sanções contra o Irã impactam os pacientes com doenças raras e a saúde da população em geral

Brasil de Fato – O Irã se encontra sob sanções há 45 anos. A primeira leva destas medidas foi imposta pelos Estados Unidos em 1979, após estudantes iranianos tomarem a embaixada do país em Teerã. Uma segunda fase de sanções foi imposta pelo governo de Bill Clinton em 1996, expandindo as anteriores e impactando investimentos na principal indústria iraniana, a do gás e do petróleo.

A partir de 2007, a União Europeia se somou com suas próprias proibições em função do desenvolvimento da indústria nuclear iraniana. Nos anos seguintes, essas medidas se aprofundaram ampliando o isolamento da economia e do sistema financeiro do Irã do resto do mundo.

O alcance das sanções abrange todas as esferas da vida no Irã. Os problemas para fazer transações financeiras também dificultam a aquisição de medicamentos, insumos para produzi-los e equipamentos médicos.

“Oficialmente eles não sancionam nossos centros de medicina, nossas empresas, o Instituto de Doenças Especiais, etc.”, diz em entrevista ao Brasil de Fato, a doutora Nazanin Farzadifar. “Mas eles dizem a empresas organizações e indivíduos estrangeiros: ‘se vocês trabalharem com o Irã, esta ou aquela organização iraniana, nós não trabalharemos com vocês, até mesmo suas contas bancárias serão bloqueadas ou o acesso a uma certa fonte de energia será cortado’.

A médica afirma que essa prática é chamada no Irã de “rede de sanções”.

Já o professor da Universidade de Teerã, Mohammad Marandi, afirma que o impacto na saúde tem sido imenso. As sanções geraram a escassez e o aumento significativo de preços de medicamentos. A situação tem sido ainda mais delicada para casos de doenças complexas, como hemofilia, esclerose múltipla, talassemia, epilepsia, e para pacientes transplantados, em diálise renal e os que estão em tratamento contra o câncer.

“Tivemos períodos em que medicamentos essenciais não estavam disponíveis”, diz o analista geopolítico iraniano Mohammad Marandi.

“As sanções significam literalmente que você não pode importar ou exportar, então os iranianos têm tido muita dificuldade em importar suprimentos necessários nas fábricas para produzir medicamentos ou medicamentos que não são produzidos no Irã e precisam ser trazidos do exterior. É muito difícil comprá-los quando você está excluído do sistema bancário”, diz Marandi.

No Irã, há cerca de 3 milhões de pacientes com 450 tipos de doenças raras, segundo a Fundação de Doenças Raras do Irã. A doutora Nazanin é presidenta da Sociedade Iraniana de Hemofilia, uma dessas doenças que afeta a mais de 12 mil pessoas no país;

A hemofilia é a deficiência de fatores que permitem a coagulação sanguínea, uma condição que provoca hemorragias prolongadas. A falta de acesso a medicamentos pode representar risco de morte para pacientes com a doença.

EUA no banco dos réus

Em 2018, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) da Haia, o principal órgão judicial das Nações Unidas, decidiu por unanimidade que os EUA deveriam remover as barreiras à “livre exportação para o Irã de medicamentos e dispositivos médicos, alimentos e produtos agrícolas”.

À época, Secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo rejeitou a decisão afirmando que a Corte não teria jurisdição para emitir essa decisão, e de que a mesma não tinha fundamento.

Este ano um tribunal iraniano decidiu que os Estados Unidos devem pagar US$ 6,7 bilhões (cerca de R$ 40 bi) em danos por suas sanções ilegais que afetam os pacientes do país que sofrem de Epidermólise Bolhosa (EB), uma doença hereditária rara que faz com que a pele se torne frágil e facilmente ferida.

Por imposição das sanções estadunidenses ​​uma empresa sueca interrompeu seu fornecimento de curativos e bandagens especiais para tratamento dessa doença, também conhecida como doença da borboleta.

Nazadin explica que as matérias-primas para os medicamentos estão sempre sujeitas a sanções, e que continuam tendo problemas no acesso a matérias-primas para muitos dos grupos especiais de pacientes, incluindo os com Epidermólise Bolhosa.

As sanções acabaram levando o Irã a desenvolver conhecimento na produção de 70 a 80 por cento dos medicamentos que utiliza.

No caso específico da hemofilia, a Nazadin afirma que o Irã se tornou o segundo país do mundo a produzir fator sete para hemofílicos e o quarto país a produzir fator oito, insumos necessários para a coagulação sanguínea.

“Isto aconteceu não apenas por causa do brilhantismo dos nossos cientistas, ou seja, não se trata apenas de ciência; tanto a solidariedade nacional, como a interdependência das pessoas, causou isso”, diz Nazadin.

“Quando as pressões externas se tornam mais fortes sobre nós, podemos ser melhores, trabalhar melhor e ser mais fortes. Talvez as sanções continuem por mais 50 anos. Nós não poderíamos simplesmente sentar e ficar olhando”, concluiu a médica.

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